A rotina tem seus encantos

sábado, novembro 25, 2006

“Lapa”

Existia a consciência livre
E o ritmo perfeito dos que
Sabiam mentir sorrindo

...

ontem,
por uma fresta de janela
no pé direito alto do Bar do Juca,
vi Nelson Pereira dos Santos numa mesa
com mais uma porção de gente cabeça
que falava através de cotovelos e nucas.
do outro lado da mesa
estava Eduardo Coutinho, o cineasta,
contando segundos nos dedos
sem achar a menor graça..
olhei por algum tempo
através do mesmo ângulo.
Nelson Pereira dos Santos
parecia uma criança feliz.
Coutinho parecia um chato
com uma peruca lilás.

quarta-feira, novembro 22, 2006

acasalamento

Nádegas sobre a relva
comichando-se
debaixo do sol.

João Duarte

terça-feira, novembro 21, 2006

“epiléticos”

Van Gogh
e um corvo amarelo;
Napoleão
e arsênico no mercúrio;
Alexandre
e um grande amor eunuco;
Júlio César
e a amante das franjas de ouro;
Lord Byron
e um Don Juan incestuoso;
Flaubert
e a palavra justa de tão escassa;
Dostoiévski
e um parricida por existência;
Lenin
e o judeu de feições mongóis;
Machado de Assis que,
ainda por cima,
era gago.

Leo Marona.

segunda-feira, novembro 20, 2006

Não vou me deixar roer para, aos sessenta, exibir o troféu
de um sorriso maduro, da alma orgulhosa de seus calos.
Não. Meu poema existe, no escuro minha ilusão respira,
agita o hipotálamo,
coço as dores, eletrizo minha lira.
Velhos sábios e maduros
vou impressioná-los filhos da puta
seguros.


Sérgio Lohmann Couri

sábado, novembro 11, 2006

“condominal”

fui denunciado criança sem pele
passei em comichão pelo tiro do estilete
devagar sempre sobressaindo em brilho, o pus
de repente uma vaga luz me embota o estômago
acrescento ao bolo de merda pela boca
e não sai nada.
nasci no meio de uma terra infértil sob enfoque duro
na casa ao lado farta família negocia enquanto janta
um prato ziguezagueia até cair no chão e explodir
os olhos são da mesma propriedade que os pratos
todos se amontoam no chão atrás de quê?
jantar de vidro.

Leo Marona.

quinta-feira, novembro 09, 2006

Tadeusz Rózewicz

Quem é o poeta

Poeta é aquele que escreve poemas
E aquele que não escreve poemas

Poeta é aquele que arrebenta grilhões
E aquele que coloca grilhões em si próprio

Poeta é aquele que crê
E aquele que não consegue crer

Poeta é aquele que mentiu
E aquele que foi iludido

Poeta é aquele que comeu da mão
E aquele que decepou as mãos

Poeta é aquele que parte
É aquele que não consegue partir


Céu vazio – 63 poetas eslavos, Org.: Aleksandar Jovanovic.

sábado, novembro 04, 2006

Cartão de visita

Me curto muito assim, o frio na barriga, a tarde esvaindo-se-noite-quase. Noite quase, inseguro, voraz e sozinho, difuso em um público rock, show rolando, pop pit stop. Nessas sei que tudo mesmo corre para a perfeição, e assim vou, na canoa, "Sérgio-conexão", ao lado do "Sérgio-eu", feliz cobaia de minhas próprias borbulhas, apostando na poesia quântica, no êxtase e dimensões desta auto-confecção: "Prazer, Elemento Paisagístico de Souza, mas pode me chamar de Alento Holístico Pereira da Silva, ou, se preferir, Risco no Ar Gomes dos Santos. Profissão? Assessor de Imensidão. Oi? Mas é claro que já nos conhecemos!"

Sérgio Lohmann Couri